
Ruy Barbosa de Oliveira — Vida, Trajetória e a Cidade que leva seu nome
O homem: Ruy Barbosa (1849–1923)
Ruy Barbosa de Oliveira (Salvador, 5 nov. 1849 – Petrópolis, 1º mar. 1923) foi político, jurista, advogado, diplomata, escritor, filólogo, jornalista, tradutor e orador brasileiro. Intelectual de projeção nacional e internacional, tornou-se um dos organizadores do novo regime após 1889, coautor, ao lado de Prudente de Moraes, da Constituição de 1891. Defendeu o federalismo, o abolicionismo e os direitos e garantias individuais.

Família, formação e abolicionismo
Filho de João José Barbosa de Oliveira e Maria Adélia Barbosa de Almeida, nasceu na antiga Rua dos Capitães (atual Rua Ruy Barbosa), freguesia da Sé, em Salvador. Desde a infância, destacou-se pelo brilho intelectual. Estudou no Ginásio Baiano de Abílio César Borges, ingressou na Faculdade de Direito do Recife (1866) e transferiu-se em 1868 para o Largo de São Francisco (SP), convivendo com Castro Alves e Luís Gama. Ainda estudante, publicou no Radical Paulistano seu primeiro manifesto abolicionista e, em 1869, defendeu em praça pública a causa dos libertos. Formou-se em 1870 e voltou à Bahia para advogar e escrever.
Jornalismo, política e República
Dirigiu o Diário da Bahia, elegeu-se deputado provincial (1877) e depois geral. Foi voz influente pela Reforma do Ensino (1881). Às vésperas de 1889, recusou o Gabinete Ouro Preto por entender que não priorizava a Federação. Com a Proclamação da República, redigiu o 1º decreto do governo provisório e assumiu a Fazenda (1889–1891). Sua gestão ficou marcada pelo Encilhamento e pela ordem de queimar registros de escravos — medida vista como forma de inviabilizar indenizações a ex-senhores, mas criticada por apagar memórias da escravidão. Foi figura central da Constituição de 1891, consolidando o habeas corpus e a laicidade.
Jurista das liberdades e o “Águia de Haia”
A frase-síntese de sua visão institucional — “Com a lei, pela lei e dentro da lei; porque fora da lei não há salvação.” — ecoou em defesas célebres, como o habeas corpus dos “desterrados de Cucuí” (1892). Exilado após 1893, escreveu as Cartas da Inglaterra e fundou, em 1897, a Academia Brasileira de Letras. Em 1907, chefiou a delegação brasileira na Conferência da Haia, defendendo a igualdade soberana entre as nações — momento que lhe rendeu o epíteto “Águia de Haia”.

Campanhas, guerra e últimos anos
Disputou diversas eleições presidenciais; a Campanha Civilista (1910) marcou a defesa do primado civil. Em 1917, no discurso O Dever dos Neutros, criticou a neutralidade passiva diante da Primeira Guerra. Debilitado, redigiu a Oração aos Moços (1920/21), obra de ética pública. Morreu em 1923; seus restos foram trasladados a Salvador em 1949.
A homenagem: o município de Ruy Barbosa (BA)
Ruy Barbosa (grafia oficial local) é um município baiano situado na Chapada Diamantina, na Microrregião de Itaberaba e Mesorregião do Centro-Norte, a 368m de altitude. A cidade repousa aos pés da Serra do Orobó (c. 950 m), usada como rampa de asa-delta e palco de ecoturismo. Conhecida como “cidade da carne-de-sol”, tem mais de 30 mil habitantes e área de 2.137,27 km². Sua economia articula um polo calçadista/industrial e a agropecuária (destaque para gado de corte), além de comércio, turismo e serviços.
Primórdios e povoamento
Os primeiros habitantes foram os Maracás, que no século XVII desciam a Serra do Orobó e atacavam estabelecimentos litorâneos do Recôncavo. As primeiras entradas europeias se ligam às bandeiras paulistas (Brás Rodrigues de Arzão, 1671), com base em Cachoeira para combater os ataques indígenas. Após o extermínio, aprisionamento e expulsão dos nativos, as terras integraram a vasta sesmaria do mestre-de-campo Antônio Guedes de Brito, que impulsionou a pecuária a partir das margens baianas do São Francisco.

A Carta Régia de 1701 (criação de gado a mais de dez léguas da costa) empurrou a fronteira pecuária para o sertão, valorizando as terras de Guedes de Brito, aforadas em “sítios” anuais. Em 1768, decisão do 2º Marquês do Lavradio (D. Luís de Almeida Portugal) adjudicou doze sítios entre os rios Capivari e Piranhas e as serras do Orobó e do Tupim ao conselheiro Joaquim Inácio da Cruz e sua sogra, Maria da Encarnação Correia. Em 1769, tomaram posse; em 1772, Gaspar de Araújo Pinto adquiriu os sítios. Com sua morte (inventário em 1778), as terras foram partilhadas — coube a Inácio de Araújo Pinto a Fazenda Orobó Grande, onde, com irmãos e Estevão de Azevedo, ergueu-se uma capela (posteriormente demolida por ruína). A propriedade passou a Antônio Francisco Pamponet (sisa em Camisão, 25 ago. 1858) e, após seu falecimento, foi dividida entre herdeiros.

Do pouso de viajantes rumo às lavras diamantinas nasceu a Fazenda Orobó Grande — rancheira que originou a povoação homônima.
Do arraial à cidade (séculos XIX–XX)
•1884 — elevação da povoação à freguesia: Santo Antônio dos Viajantes do Orobó Grande; criação do distrito de paz (Lei provincial n.º 2.476, 26 ago. 1884); canonização em nov. pelo arcebispo D. Luiz Antônio dos Santos (9 dez. 1884). Desmembramento de Nossa Senhora do Rosário do Orobó em 11 jan. 1885; posse do primeiro vigário, padre Ventura Esteves.
•25 jun. 1914 — criação da Vila de Orobó (Lei estadual n.º 1.022-A), desmembrada de Itaberaba; instalação oficial em 6 out. 1914, município de um único distrito.
•28 ago. 1922 — elevação à categoria de cidade com o nome Ruy Barbosa, em homenagem ao jurista.
•1931–1944 — criação e ajustes distritais: Lajedinho e Morro das Flores (Dec. 7.909/1931); Paraíso posteriormente renomeado Tapiraípe (1º jun. 1944). Lajedinho emancipou-se em 1962.
Composição atual: distritos Sede, Santa Clara e Tapiraípe (Paraíso); povoados Riacho Dantas, Zuca, Morro das Flores, Caldeirão do Morro, Humaitá e Nova Conquista (Colobró).
Trilhos, memória e identidade
No século XX, a cidade foi servida por ferrovia conectando-a a São Paulo (via Monte Azul/Belo Horizonte), Salvador (via Iaçu/Cachoeira) e Juazeiro. A Estação de Morro das Flores foi inaugurada em 1951; o “Trem da Gota” (passageiros) circulou até 1978; o ramal Iaçu–Senhor do Bonfim foi oficialmente extinto em 1994. Hoje, a Serra do Orobó simboliza natureza, esporte e turismo, enquanto a cultura local preserva tradições sertanejas — da carne-de-sol ao artesanato — e a memória do topônimo Orobó, anterior à homenagem ao jurista. A cidade da Águia de Haia, também nos legou um grande líder contemporâneo, meu amigo e senador Otto Alencar, companheiro que honra a trajetória de Ruy Barbosa.

Demografia e economia
Em 2022, o município registrou 28.282 habitantes (Censo IBGE). A base econômica combina indústria calçadista, agropecuária (gado de corte e leite), comércio e serviços; a paisagem serrana impulsiona ecoturismo e esportes de voo livre.
3) Ponte simbólica — o legado e a toponímia
Dar à antiga Orobó o nome de Ruy Barbosa (1922) foi um gesto de época: a Bahia reconhecendo um baiano que ajudou a desenhar a República — abolicionista, federalista, defensor das liberdades — e projetou o país em Haia. Ao pé da Serra do Orobó, a cidade traduz, no cotidiano, valores que Rui proclamou nas tribunas: trabalho, educação, cidadania e Estado de Direito. Assim, o município não apenas homenageia o homem; inscreve na sua própria história a ideia de que progresso material e memória cívica podem caminhar juntos.
Josias Gomes
Deputado Federal do PT/Bahia
Vice-líder do PT na Câmara
Se concorda, compartilhe!
Deixe um comentário