Queimar dólares das reservas internacionais vai proteger o Brasil das crises econômicas?
Equipe do ministro Paulo Guedes defende torrar US$ 180,9 bilhões, reduzindo a poupança externa para apenas US$ 200 bilhões sob alegação que é alto o custo para manter essa grande margem de segurança
Antes mesmo de assumir, a equipe econômica de Jair Bolsonaro ressuscitou uma velha discussão: o Brasil tem ou não dólares demais guardados para se proteger de crises externas?
Para o superministro da área, Paulo Guedes, sim. Conforme revelado pelo jornal Valor Econômico, ele defende a redução das reservas internacionais.Parte superior do formulário
Os recursos seriam usados para diminuir a dívida pública, que é um entrave ao crescimento. O país tem hoje reservas de US$ 380,9 bilhões, que funcionam como um seguro contra turbulências. Mas manter esse colchão tem um custo.
— Não existe essa necessidade de carregar tantas reservas. Esse é um seguro muito caro — disse Guedes.
Analistas, organismos internacionais e alguns técnicos do governo Michel Temer consideram que as reservas estão muito elevadas e que bastariam US$ 200 bilhões. Mas há a questão de quando vender as reservas. Se isso for feito em um período de calmaria, os investidores poderiam comprar os dólares e usá-los para adquirir mais títulos do governo, o que aumentaria o endividamento.
Ou seja, a medida perderia sentido. Contudo, Guedes explicou que isso deveria ser feito em momentos de crise, quando os estrangeiros retiram recursos do país.
Nesse caso, não haveria aumento da dívida. Além disso, em momentos de estresse, o dólar estaria mais caro, e o Banco Central lucraria mais com a venda.
— Se o dólar for a R$ 4,20, R$ 4,30, R$ 5, vai ser muito interessante. Se você vender US$ 100 bilhões a R$ 5, são R$ 500 bilhões. Isso significa que você vai, na mesma hora, recomprar a dívida interna. Em vez de ter R$ 3,5 trilhões de dívida, tenho só R$ 3 trilhões. Isso num cenário de crise — disse. — Sem crise não. O dólar agora está a R$ 3,60. Para que eu vou vender? Para derrubar exportação?
Os analistas destacam que uma enxurrada de dólares na praça derrubaria a cotação da moeda americana e prejudicaria o setor produtivo.
— Tem de ser tudo muito bem explicado para não dar sinais ruins para o exterior — disse o especialista em câmbio Sidney Nehme, da NGO Corretora, favorável à ideia.
O presidente do Itaú Unibanco, Cândido Bracher, vê com bons olhos a proposta de Guedes, mas ressalta que é preciso evitar volatilidade no mercado de câmbio:
— Temos uma reserva forte que nos diferencia e muito de outros países emergentes, como Turquia e Argentina. Mas temos um estoque muito elevado, então poderia usar uma parte para isso (abater a dívida).
Para Bracher, usar as reservas para investimentos seria negativo, uma vez que o Brasil precisa de poupança. Mas pagar dívidas já emitidas poderia ser saudável do ponto de vista fiscal, que é a redução da dívida pública.
Interesse que Ilan fique – A dívida é o maior desafio do futuro governo. A expectativa é que, sem reformas, o Brasil não conseguirá equilibrar as contas antes de 2023. Atualmente, o endividamento do país representa 77,2% do Produto Interno Bruto (PIB). A projeção é que passe de 84% do PIB.
O problema do tamanho das reservas internacionais é que elas foram construídas com emissões de dívidas, não com sobras de caixa do governo. A avaliação, agora, é que ela custa caro demais, mesmo com os juros brasileiros em sua mínima histórica, de 6,5%.
A discussão sobre um nível ideal de reservas é antiga. Ninguém sabe ao certo quantos dólares o país deve ter em caixa. Há quem defenda, por exemplo, que tem de ser o valor de um ano de importações. Para outros, seis meses dos vencimentos da dívida.
— Acho que a gente não precisa de tanto. Acho que US$ 200 bilhões poderiam servir em casos de crise — disse um técnico do atual governo, sob condição de anonimato.
Mas não há consenso sobre a ideia de reduzir reservas entre a própria equipe de Bolsonaro. Segundo uma fonte ouvida, a decisão caberia ao BC, que será independente.
Perguntado sobre a permanência do atual presidente do BC, Ilan Goldfajn, no cargo, Guedes reafirmou que combina com sua ideia de independência da autoridade monetária, com mandato não coincidente com o do presidente da República. Segundo Guedes, Ilan tem uma proposta que vai na mesma linha:
— O que seria a coisa mais natural do mundo? Eu dar um abraço no Ilan, e a gente vai junto aprovar o projeto. Mas tem que combinar com os russos, com a nossa equipe, com o Ilan. Não quero convidar alguém que não tenha o desejo de ficar.
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