A cadeirada do Datena no Lamaçal e os graves riscos da política sem propósito
A campanha eleitoral na maior cidade da América Latina está, literalmente, de vaca desconhecer bezerro. Cada uma que aparece faz a gente começar a se perguntar: estão disputando a prefeitura ou o prêmio de melhor meme da internet? O último grande hit? Datena e sua célebre cadeirada em Pablo Marçal, o novo símbolo do “debate” público paulistano.
A cena, claro, viralizou, como se a política agora fosse uma versão de reality show, onde qualquer coisa é válida – até agressão física. Datena virou manchete, mas o que ninguém parece lembrar é que ele também deveria estar falando de saúde, educação ou até sobre o trânsito caótico da cidade. Mas quem quer saber disso quando temos cadeiradas ao vivo? O problema é que esse tipo de cena, que caberia mais em um ringue de luta livre do que em um debate eleitoral, é um sintoma de algo maior.
O debate político em São Paulo, e em outras partes do Brasil, está se tornando uma sucessão de tiradas irônicas, piadinhas vazias e um mar de neófitos que mal entendem o papel da política no destino do povo. É como se a campanha tivesse se transformado em um grande espetáculo de humor de quinta categoria. Propostas? Ninguém quer saber de conteúdo. O que importa é quem soltar a piada mais ácida, a agressão vil, inclusive a violência física. Enquanto isso, os eleitores, que deveriam estar atentos às ideias, acabam sendo seduzidos por essas performances dignas de um show de calouros.
Vale lembrar que os debates políticos na televisão, lá nos idos anos 1960, começaram nos Estados Unidos como uma maneira de informar os eleitores sobre as propostas dos candidatos. Era um palco para discutir o futuro de uma nação. Mesmo com as loucuras de Donald Trump, por lá ainda se mantém a seriedade, pelo menos na frente das câmeras. Mas, aqui, a coisa está indo ladeira abaixo. A cadeirada de Datena é só a cereja do bolo desse espetáculo bizarro, onde a violência virou mais um item do repertório de uma campanha que esqueceu que o foco deveria ser a cidade e seus milhões de habitantes.
O mais curioso de tudo é que esse tipo de exposição negativa parece ter efeito. Quem bate mais forte – seja com palavras ou cadeiras – atrai a atenção. O eleitor, sem perceber, é fisgado pelo circo, enquanto os temas essenciais vão ficando em segundo plano. A cena política brasileira, em vez de se elevar, desce ladeira abaixo, transformando-se num teatro onde a violência e o insulto ganham mais palco do que a discussão de ideias.
Perigo à vista para a esquerda e progressistas. Sempre nos diferenciamos na política pela apresentação de quadros preparados, propostas que vão de encontro com as necessidades da população e cidades. No entanto, também estamos sendo fisgados para esse mar morto, onde as redes sociais condicionam os candidatos aos conteúdos caça-clique/curtidas, como se a política se resumisse a quem é mais popular nas redes sociais. Mesmo que, depois do meme seguinte, não reste nada de concreto na mente das pessoas.
A política também precisa de alegria, humor, leveza, boa dose de arte, mas não pode ser um “teatro barroco e louco”, tal qual o poema “Mito” do Drummond. É na política que resolvemos os graves problemas a serem enfrentados. É na política que se constrói uma sociedade civilizada, crítica, ciente do nosso dever no mundo. As redes sociais chegaram para ficar e influenciam diretamente a política, que, por sua vez, influi no destino de uma nação. É urgente regular as mídias digitais, sobretudo na questão eleitoral. Já temos exemplos catastróficos do impacto dos conteúdos tóxicos nas democracias.
Os povos pagam a conta de desastres produzidos pelo teatro dos horrores: Trump, Bolsonaro, Zelensky, Milei e incontáveis parlamentares que se elegeram através de suas performances animalescas brutalmente propagadas nas redes. É preciso abrir a caixa preta dos algoritmos que priorizam discursos de ódio, mentiras e performances toscas em detrimento de temas centrais da sociedade. Este é um problema universal e precisa ser enfrentado de frente. A política, com suas virtudes e limitações, não pode ser reduzida a uma performance digital.
No fim das contas, a grande questão é: será que ainda há espaço para um debate político de verdade ou estamos condenados a assistir de camarote esse show de horrores? Uma coisa é certa: a democracia merece mais do que cadeiradas e piadas mal ensaiadas. Precisamos agir.
Josias Gomes – Deputado Federal do PT/Bahia
Vice-líder do PT na Câmara
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