
Memórias e Disputas no PT
Ainda que tenhamos iniciado nossas trajetórias políticas em campos distintos, sempre estivemos movidos por um mesmo propósito: construir um país justo, fraterno e soberano. Somos militantes da esquerda brasileira, formados em trincheiras diferentes, mas sempre do mesmo lado da rua — apenas em casas diferentes.
Josias Gomes participou do movimento de fundação do Partido dos Trabalhadores. Emiliano José, naquele momento, atuava na tendência popular do MDB, onde também se agrupava uma parte significativa da esquerda combativa. Mais adiante, os destinos políticos nos fez reencontrarmos no PT, partido que presidimos em momentos distintos de sua história.
Assinamos juntos esta contribuição ao debate interno do Partido dos Trabalhadores, com o desejo de dialogar sobre o que nos une: a militância. E, especialmente, sobre os laços, continuidades e tensões entre os velhos e os novos militantes que seguem fazendo do PT uma força viva da luta popular no Brasil.
Há silêncios que não são pazes. E há falas que embora firmes, nascem da dor antiga de quem não desistiu de acreditar no Brasil.
Trazemos no peito como muitos dos que se lançaram ao movimento pró-PT em 1979, para concluirmos com a fundação do PT em 10 de fevereiro de 1980, as marcas dos embates que travamos não apenas com o mundo lá fora — aquele da repressão, do autoritarismo, da desigualdade naturalizada — mas também com os dilemas que nos habitavam. Fomos, desde sempre, um partido em disputa. Não por vaidade, mas por intensidade. Por paixão e convicção política. Por desacordos que não escondiam o amor comum por um país mais justo.
Nossas diferenças, companheiros e companheiras, não eram rachas. Eram quase sempre faíscas de ideias em combustão. Tínhamos fome de futuro. E nos doíam cada concessão que a realidade nos impunha.
Sobrevivemos à ditadura civil-militar, atravessamos as promessas e fraturas da redemocratização, e testemunhamos o refluxo da força transformadora da sociedade civil. Vimos perplexos as direitas reencontrarem seus nomes — não mais envergonhadas — enquanto muitos se perdiam na névoa da falsa neutralidade, da política sem lado.
Mas o tempo é mestre. E hoje, mais do que nunca, os povos sabem identificar quem defende os interesses desta pátria e quem se ajoelha aos pés de potências estrangeiras. O Brasil não tolera mais máscaras. Nem traições disfarçadas de moderação.
E há, dentro das sociedades brasileiras, uma outra sociedade — uma sociedade petista. Feita de gentes que nos acompanham, que marcham nas ruas conosco, que defendem o legado de Lula e os projetos de país que construímos coletivamente. Gentes que vibram com nossas vitórias e sofrem com nossos tropeços, mas que, por diferentes razões, não se integram plenamente às vidas orgânicas do partido, aos seus núcleos, setoriais e diretórios. Eles são parte de nós. E nós temos as tarefas históricas de acolhê-los.
Pois muito bem. Estamos confiantes. As novas gerações de dirigentes petistas, forjadas nas lutas recentes serão capazes de dialogar com os saberes das distintas gerações e promover transições que nos orgulharão — a nós, velhos militantes que já enfrentamos tantos ventos contrários. Elas não têm que repetir nossos caminhos, mas podem caminhar com os nossos acúmulos, nossas cicatrizes e nossos sonhos ainda vivos.
Não falamos aqui em nome de ninguém. Nem respondemos a ninguém. Apenas deixamos ecoar, nas frestas do presente, essas memórias carregadas de afeto, contradição e coragem. O que nos move não é a unanimidade, mas os compromissos. Não é o consenso fácil, mas as entregas sinceras.
Ainda estamos em disputa — com o mundo, com os outros e conosco mesmos. Mas seguimos. E seguimos juntos. Sempre.
Josias Gomes – Ex-presidente do PT/Bahia
Emiliano José – Ex-presidente do PT/Bahia
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